sábado, 21 de julho de 2007

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Cada gota, é uma desolação relampejada pela Firmamento. Cada pingo, um meteoro terrível, fulminante, incansável. Quem dorme, enquanto lá fora urge esse redemoinho de confusão, essa tempestade atroz, carregada de ansiedade? A núvem de mágoas prolonga a já interminável noite; o relógio transforma-se numa máscara ameaçadora, ali, pendurada na parede, anunciando o lapso eterno, o segundo, o minuto, a hora que abarca toda uma vida. Os lençóis, manchados de vergonha, não escondem as máculas espirituais, as aberrações da alma, e não passam de um peso, uma condenação velada, subjetiva, carniceira. Os olhos não piscam; acompanham, como falcões perpicazes, os assassínos invisíveis, os espiões que não existem, os perseguidores imaginários. O sono, por si só, a hecatombe voluntária, a fogueira inquisitorial. Desassossego, imperceptível, presente, eterno [...]

sexta-feira, 20 de julho de 2007

desespero


Não há descanso para o louco. Não há silêncio enquanto ecoa esse grito mudo, inaudível, cacofônico. Não há paz na trilha dessa sombra negra, que se estende como uma capa terrível, mortal, semente da desolação. O peso da agonia é maior do que a própria vida. A apatia, como uma sanguessuga do espírito, vórtex sulfuroso, obliteradora, seca as mais tímidas sementes de esperança. Corroi-me, o desassossego; a inquietudade, perseverante, incansável, perpétua. O halo de desespero, já natural, incorporado, breu contagioso, emana a catástrofe da alma. Fracasso, transcendente ao tempo. Dor passada, presente e futura. Nada cresce nesse campo estéril. Amor, afeto, carinho... apenas os frutos podres de um sentimento corroído pela própria sabedoria, a perspectiva, cada vez mais pessimista, de danação. Todo o sofrimento do mundo, condensado numa única gota, numa única lágrima imperceptível, mas presente como a própria morte no canto de uma ave agourenta. Cada segundo, cada sussuro do Verbo, cada ato de criação, uma tortura invisível, indolor, mas pungente, fétida, destruidora. Distante de descrição, inconcebível em palavras, desconhecida para o abençoado. Para nós, não existe o glorioso caminha da redenção ignorante.

segunda-feira, 16 de julho de 2007

Brado

Não vejo ninguém, do alto da minha Torre de Marfim. Cercado de brumas, minha voz ecoa distante, para ser ouvida somente pelo vento triste e pelo céu indiferente. Canto poesias e declamos sábias palavras, todas inaudíveis, afastadas da realidade, uma mentira que eu contei e acreditei, para ficar cego ante essa terrível e dissimulada realidade. Se tento alcançar o mundo, tocá-lo, timidamente, com um dedo, uma lufada de ar frio me desencoraja. Pessoas passam e esbarram, inebriadas pelas falácias de um falso profeta qualquer, um ignorante que balbucia absurdos e engana aos pobres diabos, todos eles, encantados com uma mediocridade venenosa, enquanto eu caio na minha armadilha, uma cilada surreal, dolorosa e tentadora. Não existo, não deixo referências. Permaneço ali, estático, estoicamente prostrado entre as regras apolíneas, regentes de uma vida impossível, e o caos dionisíaco, verdadeiro bálsamo para esses ignóbeis fantasmas que rodeiam meu espelho, sujam de ignorância esse fino vidro que me afasta de algo que não conheço, mas que ouço chamarem de vida. Ridículos, fedorentos moribundos, bonecos tolos. Encho-me de cólera por não compartilhar essa juventude, essa infantilidade abençoada que alcança apenas os mais selvagens e impetuosos hérois quotidianos, rasos e ridículos, como só os imbecís conseguem ser. Resta-me, somente, a embreaguez de meus próprios pensamentos, meu axiomas solitários, meu solilóquio virgem, que jamais será violado por um feroz idiota. Fico, sem escolhas, agarrado ao meu abstrato, enciumado, louco, violento, esmerando uma jóia invisível, que jamais, e por ninguém, será desejada.

quarta-feira, 11 de julho de 2007

passado



Os ecos de um passado retumbam na minha cabeça, em explosões de dores e saudade. Eu caminho, feito cidadão do mundo, entre experiências e sentimentos de outrora. Tal qual Michelet, tenho por companhia amores sepultos. Sonho com quem já foi, desejo quem já não é. A cada lágrima que cai, o peso da vida aumenta; "olhe pra frente!", diz-se, enquanto olho para trás, sempre espiando sobre meu ombro, esperando algo que virá. Não guardo esperança. Minha certeza reside nas areias, já escorregadas, da ampulheta. Espero pelo passado, sem ambicionar o futuro, sem saborear o presente. Incomodo-me com essas pessoas que não me pertencem, com esses hábitos tão estranhos e tacanhos, vindos num piscar de olhos, quando o tempo passou. Passou e eu nem vi... nem senti. Passou, o tempo. Passou, e me deixou para trás.

domingo, 1 de julho de 2007

Momento

Por um momento, eu gostaria de deitar minha cabeça sobre a grama macia e olhar os segundos passarem, sublimes, eternos. Conta-los, um por um, enquanto alteram para sempre aquele olhar estático, que, de tão simples, é único, e jamais volta; por um momento, eu gostaria de respirar o ar puro, a brisa soprada pelo próprio Paraíso, enquanto todas as preocupações voam embora com o vento; por um momento, eu gostaria de não sentir nada, enquanto sinto tudo, de uma só vez, por um segundo, e por toda a eternidade; por um momento, eu gostaria de sorrir para sempre, de tocar o amor, de entender e permanecer na inocência; por um momento, eu gostaria de saber o que é viver, e sentir o que é morrer; por um momento, eu gostaria de voar... Por um momento, eu gostaria de nunca parar de sonhar.